Equilibrando a minha bicicleta, com o pé direito na calçada e a mão esquerda no guidão, esperava que o Glass me desse as instruções para chegar ao meu destino. Enquanto olhava para o prisma retangular acima da minha sobrancelha, senti um toque no meu ombro direito. Antes que eu pudesse virar, uma voz me perguntou: "Essas são as novas Google Goggles?".
“Na verdade, é o Google Glass!”, respondi.
Tenho usado o Google Glass (sem plural, por favor) por mais de dois meses. Eu fui um dos poucos afortunados que garantiu um par através do Programa Glass Explorer do Google para desenvolvedores e consumidores pioneiros.
Como a maioria dos exploradores, eu tinha uma visão de grandeza, um interesse pelo luxo tecnológico e pela inovação empolgante. A realidade é, infelizmente, mais mundana. Ao usar em público o meu Glass cinza escuro, me tornei mais tímido do que eu esperava ser, especialmente em banheiros públicos, academias e outros ambientes mais suscetíveis aos olhares.
Ser um dos primeiros a adotar essa tecnologia "vestível" também inclui uma responsabilidade cívica única. Quando você é o proprietário de um artefato experimental, mundialmente anunciado, a carga gerada por ter de compartilhar, ensinar e entreter é muito real, não só com amigos e familiares, mas também com o estranho amigável que nunca falta.
O cenário que tem se repetido mais de uma dúzia de vezes, é mais ou menos assim:
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Perguntam sobre o Glass.
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Perguntam se eles podem usá-lo.
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Falam muito alto em uma tentativa para que o Glass faça algo legal. "OK, Glass... humm, oh meu Deus! é como a Siri?"
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De forma atrapalhada, deslizam a interface Touch do Glass, ocasionando uma ligação não intencional para o seu primo, noiva ou outras pessoas que aleatoriamente acham no diretório.
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Acidentalmente publicam autorretratos desfavoráveis.
Eu entendo por que as pessoas são tão curiosas sobre o design. A lente quase indestrutível pesa praticamente nada. Produz vídeo de qualidade HD e o seu sistema de áudio é extremadamente eficaz. A maioria das pessoas olha com curiosidade e todos os comentários têm sido positivos (uma nota possivelmente relevante é que eu vivo no coração de Silicon Valley).
Alguns não-usuários mal intencionados e formadores de opinião culturais estão criticando de forma maliciosa o Glass como o mais recente "símbolo nerd", similar ao Segway, só que vestíveis. A revista Wired publicou um artigo intitulado "Pessoas como estas podem acabar com o Google Glass antes mesmo dele decolar", onde jovens e experientes investidores em tecnologia eram mostrados como "patetas" enquanto usavam o Glass. O que isto significa? Que se eles não ficam bem ao usá-lo, nós também não. Eu não vou dar muita importância para a parte da moda, exceto que me disseram que tirar fotos com o Glass me fez parecer exponencialmente menos burguês do que tirá-las com um iPad.
Olhando através de um olho de vidro e outros perigos
O meu plano inicial era desenvolver um aplicativo para o Glass, mas isso ainda não se concretizou. O Glass Development Kit (GDK), que dá acesso aos desenvolvedores às interfaces de programação de aplicativos (APIs) para criar aplicativos para o Glass, foi anunciado na conferência Goggle I / O, em maio. Até a data em que escrevo esta matéria, o GDK não tinha sido lançado.
Isso tem deixado impaciente a mim e a outros usuários do Glass. Toda vez que eu uso o Glass não posso deixar de imaginar uma infinidade de possíveis aplicativos: visão de raios-X, telecinésia e um home theater móvel. Brincadeiras à parte, dentre as aplicações, que são limitadas, porém, muito úteis, se incluem a captura de fotos e de vídeo hands free, navegação GPS e comandos de voz. A maior desvantagem é, por falta de um termo melhor, olhar através de um "olho vidroso". Isto se refere à aparência sem movimento que a maioria dos usuários tem quando usam ativamente o Glass. Meu caso: Eu estava tirando fotos em uma das minhas trilhas favoritas. Enquanto arrumava tudo para tirá-la, eu fiquei tão imóvel, para que a imagem não ficasse tremida, que uma mosca quase entrou na minha boca.
Embora o futuro do Glass como um inovador social ainda está em dúvida, alguns estão voltando sua atenção aos aplicativos para as equipes de trabalho. Pense no Square e no jeito que ele facilita pagamentos de cartão de crédito para as empresas muito pequenas, o Glass poderia fazer o mesmo para as comunicações entre empresas. Eu me lembro, quando tinha 19 anos, no meu primeiro emprego na Home Depot. Poucos dias após ser contratado, o gerente me chamou ao seu escritório e disse que eu trabalharia no departamento elétrico, porque o encarregado daquela área estava doente. Infelizmente, eu não sabia nada sobre eletricidade e, por tanto, nada sobre equipamento elétrico. Então eu passei o resto do dia evitando perguntas de clientes confusos (desculpe Home Depot).
Quão diferente teria sido se eu tivesse algo como o Glass! Imagino-me escanceando códigos QR e obtendo tudo o que eu precisasse saber sobre lâmpadas fluorescentes frente aos meus olhos, de forma instantânea. Se eu estivesse realmente em apuros, eu poderia ter chamado alguém para me dar assistência. Ou na sessão de casas de madeira, poderia ter compartilhado minha tela com um colega de trabalho que soubesse um pouco mais sobre como conectar o fio terra às caixas de fusíveis das casas construídas antes da Segunda Guerra Mundial.
RoboCop
No momento, os órgãos de segurança pública têm contemplado ideias similares ao Glass. Imagine ter aplicativos de reconhecimento de imagem que imediatamente lhe digam tudo o que você precisa saber sobre uma pessoa: altura, peso, antecedentes criminais, etc., tudo em um fone de ouvido hands-free.
Um operador de máquinas em uma fábrica pode atualizar em tempo real seus supervisores sobre os perigos potenciais, transmitindo literalmente o que está vendo. Talvez o trabalhador de manutenção não precise mais usar o nível de bolha, porque a imagem projetada de uma linha geométrica irá lhe dizer se a prateleira na parede esta reta ou não. Na verdade, a única coisa que nos limita é a nossa imaginação.
É vantajoso para o Google lançar o quanto antes o GDK, pois a criatividade dos desenvolvedores e os aplicativos que eles irão criar justificarão ou não, o seu conceito de computadores "vestíveis". Isso nos permitirá julgar se usar o Glass em sua cabeça é melhor do que tirar o smartphone do seu bolso. Até lá, vou continuar sendo questionado por desconhecidos amigáveis sobre a minha escolha de usá-lo nos meus olhos.